terça-feira, 26 de outubro de 2010

Reconstituição - "Essa é uma história que jamais poderia deixar de ser contada"

Papudinho é um vendedor de picolés e ex traficante, que descobriu nas palavras da bíblia o caminho da superação das conseqüências geradas pelo mundo do tráfico.
Na prisão viveu 19 anos de solidão, rompida por uma única visita de Dragon Boy, um jovem que apesar de não ter sequer conhecido seu pai, teve uma trajetória, que segundo o rapaz era uma herança paterna. Ambos se conheceram no primeiro do último dia.
Reconstituição encontra-se entre as vinte obras que concorreram ao Festival de Cinema Nós na Tela, que aconteceu na Cinemateca Brasileira,em São Paulo, entre os dias 20 e 21 de outubro.
A obra foi premiada pelo edital Nós na Tela 2009, doMinistério da Cultura e foi produzida por Gabriela Cativo, em Manaus
A diretora atua no programa AMACINE Futuros Cineastas e faz parte do Centro Universitário de Cultura e Arte, o CUCA Amazonas.

Festival de Teatro movimentou artistas do Norte


O VII Festival de Teatro da Amazônia, realizadode 08 a 17 no Teatro Amazonas. Realizado pela Federação de Teatro do Amazonas (Fetam) com apoio da Secretaria Estadual de Cultura (SEC) com mostras competitivas em nove categorias – adulto e infantil -, mostras paralelas, oficinas, debates, mesas redondas e seminários. Além de Manaus, algumas localidades do interior do Estado também receberam apresentações teatrais.
Os espetáculos foram apresentados no Teatro Amazonas e Teatro da Instalação, já os debates e mesas redondas ocorreram no Palácio da Justiça; o Largo de São Sebastião, Largo do Mestre Chico e Parque Senador Jefferson Peres receberam a apresentação de artistas circenses dos grupos Cia Cirquinho do Revirando (SC), Cia Circove (Argentina) e Cia de Teatro Lo Combia (Colômbia). Com a participação da companhia Raízes do Porto de Rondônia.
Surpresas a parte, numa das montagens o púlico pode apreciar a interpretação de uma das integrantes do Circuito Universitário de Cultura e Arte - CUCA/AM, Beatriz Calheiro.

Este ano o festival homeangeou a atriz Argemira da Silva Sadim, que atuou por cerca de 30 anos em festivais no Amazonas.


Crítica:

O espetáculo "Hoje Sou Um: E Amanhã Outro", da Cia Vitória Régia, regido por Nonato Tavares que interpreta um Rei louco que está perdido nas próprias burocracias que engendrou, mas trata-se de uma farsa barroca, onde o encenador prioriza o que de melhor encontra-se em Qorpo-Santo, o brincar na cena, a liberdade sem limites no criar as mais prosaícas circunstâncias que fazem da trama uma delícia de se acompanhar, feito súditos da insanidade. E a brincadeira não nos deixou nestes 40 minutos em que pontificou este rei, da mesma linhagem que fez surgir, tempos depois, obviamente por pura coincidência, o Ubu Rei de um certo Alfred Jarry.A inserção dos elementos “regionais”: o boi, a toada, os políticos locais, nada escapou dos éditos e decretos lunáticos deste barroco rei, que ostenta como forma ultrapassada, a linguagem quinhentista. Isso nos meados do século 19, quando o romantismo que envolvia a realeza no Brasil já estava sucumbindo às trapaças republicanas, ou seja, o Rei já está velho, caduco e as fraldas devem ser colocadas nele para que a merda real não escorra pelo palácio, para que o poder republicano não entre com sua higienização e peça a cabeça do Rei, como aconteceu na Revolução Francesa. Coisas do poder, uns estão equilibrados nele, enquanto outros tentam entrar e se locupletar dele, de qualquer forma ou meio. Maquiavélico Rei, mas que trama apenas em sua incapacidade de ser são, lúcido. A montagem de Nonato Taveres é de uma elegência em detalhes, como é de praxe em suas obras. A roupa como estética do barroco acompanha o zeloso trabalho de Koia Refkalefsky(que também é a Rainha), e importante destacar que este barroco funciona com poucas variações cromáticas, onde o vermelho e o negro são as mais evidentes no palco, o que facilita a iluminação, com precisas alternâncias de focos e de refletores e suas tonalidades.O quinhentismo linguístico foi uma opção de garantir o registro da época de Qorpo-Santo, e a cavalaria galopa de forma absurda, e lembra os cavaleiros medevais do Monthy Pyton no “em busca do cálice sagrado”. As referências a Alfred Jarry e ao clássico personagem do Ubu Rei são notórias, e que coroa de Rei é aquela, o efeito cênico é deslumbrante, não dá para imaginar mais aquele Rei sem a sua estonteante coroa. A pomposidade do figurino, a maquiagem, tudo foi calculado com zelo máximo pela produção e pelo encenador.A loucura pelo poder atravessa etapas históricas, e prossegue por toda civilização, antiga e futura, e entre a tênue linha entre sanidade e loucura, encontra-se o poder, os mandatários, semi-loucos num mundo que teima a se tornar curado, uma tarefa vã, de terrível constatação. Qorpo-Santo já alertava em seus textos sobre estas questões paradoxais, existencais e políticas. Vivemos a insanidade de nossos refluxos de lucidez. A música na medida certa, sem arroubos desnecessários ,fazem da sonoplastia ao vivo desta obra de 40 minutos um espetáculo meticuloso, não barulhento, que chega aos ouvidos de forma suave, mas contundente. As damas que acompanham a Rainha são involúcros de uma disfarçatez, dançarinas provocantes de um boi bumbá de “Paristins”, por isso que o Rei passeia em seu boullevard de Versailles. Para relaxar, para se esquecer...Os Soldados, com seus figurinos à la sadomasoquismo, lembram os centuriões na versão moderna das dominatrix. Os decretos absurdos pululam deste palácio feito colônia de loucos, onde o ministro tenta, em vão, subverter uma ordem, claro que não consegue, pois o caos domina sempre o ambiente, mesmo nos momentos de aparente controle físico e emocional do Rei, mesmo nos seus destemperos de personilidade e na sua senilidade.Um dado curioso e que remete aos aparatos da nobreza no Brasil: nos tempos do império realmente havia uma equipe que tratava da higiene do Rei, e alguns tronos tinham um fundo falso, espécie de vaso sanitário, para quando o Rei participasse de uma longa reunião não precisasse interrompê-la, evacuando ali mesmo no “trono-vaso”. Um escravo, então, recolhia a merda real e a levava no penico real para a rua real. Era desta forma mesmo. A atualidade em Qorpo-Santo é incontestável, e por mais que seja uma precipitação e até mesmo preciosismo patriótico vincula-lo às vanguardas teatrais que o sucederam, é notória sua capacidade de inovar nas letras e na dramaturgia feitas naquele momento histórico, nos meados do século 19. Um teatro límpido e objetivo, de uma trupe que funciona perfeitamente bem no que se propões a colocar em cena, e mesmo que algumas falas tenham se “atropelado” ou que engasgaram na voz da Rainha, tudo isso é irrelevante, pois a perda de voz da Rainha também representa no meu ensejo de observador não implacável, a própria fraqueza do poder real. A Cenografia econômica de Nonato Tavares, um bobo musical e um trovador que são este duo da sala real, tudo se encaixa nesta proposta de cena. Uma cena, aliás, que de tão simples levou o público a aplaudir o “voo da cavalaria”, num movimento tão simples, mas que transmitia uma maneira de brincar e de sonhar, tal qual uma Cavalgada das Valquírias num palco onde este mesmo público fez esforços pendulares com a cabeça e pescoço, este um único problema a ser resolvido, evitar este incômodo ao espectador, pois o mesmo plano de cadeira no palco do Teatro Amazonas impossibilita visão total das cenas. Mais isso não chega nem a coçar, pois o riso aparece e depois a gente trata do torcicolo. E viva o Rei!


*Jorge Bandeira é dramaturgo, autor de A Carroça de Pandora do Largo de Sabá Tião I e II.